"Vanitas allegory" de Pieter Boel
Meninos de rua cheirando cola,
homens encovados cheirando fome,
mulheres-puta cheirando homens,
nas esquinas,
embaixo dos faróis
e do céu azul
- o lar.
E, logo adiante,
um homem gordo
discursando a fome,
alimentando-se da fome
e desgraças que grassam.
Discursos cínicos,
discursos malvados,
alheios aos olhos etíopes.
Discursos que dilaceram a alma
de corpos já dilacerados,
vilmente,
criminosamente.
Ideais que ulceram feridas,
para de elas se alimentarem,
cooptando os desesperançados,
os sedentos de justiça
de Deus,
que os deixa à sanha
dos que,
como aves de rapina,
vivem da degeneração,
dão rezas que fingem rosas...
Sofre à mão estendida,
menino ruim,
teu destino é pegar arma
e droga!
Padece, puta velha,
teu destino são as enfermarias
de algum hospital fétido!
E, homem-fome,
morrerás vendo os teus morrerem,
chorando indignidades,
vendo os matadores do futuro
matando o presente...
Só se salvarão
os homens dos dízimos,
os homens dos votos,
gordos e alheios...
De: João Costa Filho